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Os evangelistas Mateus, Marcos e Lucas referem-se a um personagem discreto que auxiliou Jesus a transportar o patíbulo (madeiro componente da cruz) até ao Gólgota. Trata-se de Simão, nascido em Cirene, região do Norte da África, onde hoje se situa a Líbia. Homem do campo, de trabalho rude, que nunca se envolveu em confusões. Em virtude de sua origem, passou a ser conhecido como Simão, o Cireneu. Era casado com Mikal e tinha dois filhos: Alexandre e Rufo.

Apesar das poucas informações sobre ele, algumas obras ousaram traçar-lhe o perfil e descrever os passos que o destino lhe reservou, dando ensejo a que a Federação Espírita do Paraná publicasse uma matéria no seu “Jornal Mundo Espírita”, edição de agosto de 2004, da qual extraímos dados reais, conquanto permeados por alguma fantasia que um dos autores consultados reconhece em sua obra.

Simão vinha do campo rumo a Jerusalém, onde morava havia pouco tempo, quando se deparou com um cortejo tendo à frente soldados romanos, conduzindo condenados ao suplício. Porque não pudesse passar pela multidão, Simão parou junto a uma porta. Enquanto isso, Jesus caía ao peso da cruz e não conseguia retomá-la, já que seu corpo estava fragilizado pelos açoites e maus-tratos. O centurião descobriu a figura de Simão nas proximidades e cuidou de convocá-lo a assumir a cruz, porque viu nele vigor físico capaz de levá-la ao destino. Embora resmungando intimamente, não pode se esquivar. No trajeto, pensava apenas em concluir aquela jornada incômoda e poder chegar em casa para cuidar da saúde de Alexandre, que deixara febril.

De fato, ao entregar a viga no local determinado, rumou célere para seu lar, desconhecendo a identidade dos condenados. Abraçou o filho enfermo, transmitindo-lhe, sem o saber, as energias capturadas espontaneamente ao contato com o madeiro impregnado pelo Salvador. Em poucas horas o jovem estava curado. A esposa notou diferenças comportamentais no marido.

Dias mais tarde, Maria, mãe de Jesus, acompanhada por um rapaz, certamente João, procurou Simão para agradecer-lhe a ajuda dada a seu filho. Mais um pouco de tempo e outras pessoas acercaram-se dele para saber detalhes. Isso o incomodou ao ponto de se mudar com a família para a capital do Império. Mikal e os filhos foram conquistados pela palavra de Paulo de Tarso, que pela região pregava, e se tornaram cristãos. Embora Simão assim não se declarasse, transitava bem no meio deles. Por força disso, e porque havia carregado a cruz para “seu Mestre”, o que era inconteste, acabou por ser preso, tendo trágico desfecho: “foi pendurado a uma cruz, teve seu corpo untado de betume e ardeu como um archote para iluminar os jardins do Imperador”.

Embora Cirene tivesse dado alguns filhos ilustre ao mundo, “nenhum deles conseguiu o galardão que aquele anônimo trabalhador alcançou, ao cooperar com Jesus Cristo, sem sequer conhecê-lo, naqueles momentos de testemunho e de definição muito graves”, diz Raul Teixeira in Jesus e o Cireneu – Vida e mensagem.

Observemos que o pouco de tempo em que Simão carregou a cruz após Jesus, rendeu-lhe uma transformação espiritual digna de imortalizá-lo como um dos mártires do cristianismo, em testemunho de sua regeneração. Se no início o encargo pegou Simão de surpresa, causando-lhe desconforto, estejamos certos de que seu sacrifício final coroou sua transformação com a coroa da vida prometida por Jesus.

Por que o nosso personagem, que levava uma vida pacata, não se envolvia politicamente nem era discípulo de Jesus findou seus dias no corpo físico como se o fosse? Primeiramente, lembremos que nada acontece por acaso. Não há sorte nem azar, porque a obra divina é perfeita.

O que ocorre em todos os planos da vida é o cumprimento dos projetos traçados para auxílio de nossa evolução, consideradas as circunstâncias individuais, tais como merecimento e maturidade. Ainda que nossa consciência atual não alcance a plenitude dessa programação, não há negar que ela está em harmonia com o traçado da perfectibilidade. Assim é que um evento inesperado pode alterar radicalmente nossos planos de hoje, justamente para dar cumprimento ao Plano Maior, que tem por objetivo a libertação para uma vida espiritual melhor. Simão, tocado pela sublime energia do Cristo, transformou-se e recebeu o batismo de fogo, para o qual estava pronto.

Queridos leitores, interferências superiores como a relatada  repetem-se aos milhares a cada dia. Bastas vezes, somos constrangidos por circunstâncias ou pessoas a certas iniciativas que podem mudar nossos rumos existenciais. A atmosfera psíquica de outrora, sempre renovada e a energia vibrátil transformadora permanecem ao alcance de todos na substância pura do Evangelho de Jesus.   Seremos compelidos a renunciar a certos confortos, a abandonar a quietude contemplativa para servir, ainda que a custa de muito esforço, mas teremos sempre as energias sublimes a nos fortalecerem os tentames, tanto mais quando procuramos nos aproximar de Seus ensinamentos, fonte de amor e luz.

Como no exemplo colhido, cuidemos de aceitar nossa cruz, aqui considerada como sendo os desafios da vida e sigamos a mensagem do Cristo para vencermos a tudo e principalmente a nós mesmos, para que esta jornada seja um ponto marcante em nosso processo evolutivo.

Marcus Vinicius

 

 

Fontes na origem:

GAROFALO, S. et al. Morrer em uma cruz in Vida de Cristo. São Paulo, Paulinas, 1982, cap. 16;

PAPINI, Giovanni. O cireneu. In As testemunhas da paixão – sete lendas do evangelho. São Paulo – Saraiva, 1950,cap.4;

ROHDEN, Humberto – Caminho do Calvário, in – Jesus nazareno, 6ª ed. São Paulo – União Cultural, vol. 2 ,cap. 187;

TEIXEIRA, J. Raul. Jesus e o cireneu in Vida e mensagem. Pelo Espírito Francisco de Paula Vitor. Niterói; Fráter, 1993, cap. 9;

VAN DER OSTEN, A. José in Dicionário enciclopédico da bíblia. A ed. Petrópolis, vozes, 1985, verbetes Cirene e Simão.

Enciclopédia Mirador Internacional. Rio de Janeiro: Britannica, 1986, v. 10, verbete Grécia 1.50 e 3.7.5.

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