Viver é uma arte! Imagine que saúde, família, trabalho, vida social, espiritualidade e voluntariado sejam pratos equilibrados nas extremidades de varetas, os quais devemos manter girando. Como malabaristas, é preciso impulsionar cada peça de louça com alguma energia, de forma que dê voltas ao redor do seu eixo, sem cair.
É natural, por vezes, dar um pouco mais de foco a um ou outro prato, pois é nesse momento que acontecem os rompantes de desenvolvimento e verdadeiramente aprendemos. Eureka! A cada salto de crescimento, celebramos. Evoluir é uma grande satisfação!
No Sermão da Montanha, Jesus nos ensina que ninguém acende uma candeia (lampião) para pô-la debaixo do alqueire; põe-na, ao contrário, sobre o candeeiro, a fim de que ilumine a todos os que estão na casa (MATEUS, 5:15). Trata-se de orientação para que a “luz” seja disponibilizada a todos.
Somos instrumentos de trabalho de Deus. Cada um de nós funciona como uma candeia sobre o alqueire. Repassamos o aprendizado em pulsos de humanidade que proporcionam gratidão a quem dá e a quem recebe.
O ensinamento pela palavra é um desafio imensurável. Para prover auxílio eficiente é necessário observar as condições intelectuais, emocionais e espirituais daquele a quem falamos.
Há quem seja solo pronto à semeadura. Esses logo reconhecem nas palavras o alimento do qual necessitam para germinar e brotar. Outros possuem as condições físicas necessárias ao plantio, mas lhes falta maturidade para reconhecer a oportunidade de crescimento ou vontade para trabalhar pelo autodesenvolvimento. Há, ainda, os que não possuem a devida articulação mental ou que sofram com alguma perturbação espiritual momentânea que impeça o reconhecimento do ensejo evolutivo.[1]
É fato que muitos se opõem a novas ideias ou reagem defensivamente, seja pela falta de maturidade ou pela incapacidade de compreensão da mensagem. Na medida em que tentamos divulgar o conhecimento e somos repelidos, quase sempre e irrefletidamente, tendemos a insistir. Então, como pretensos conselheiros, precisamos nos vigiar e resistir para que não cruzemos o limite entre o pedido de iluminação feito pelO Cristo e o (des)respeito ao próximo.
No momento em que o sentimento de frustração e o incômodo pela resistência ao que falamos se transformam em impaciência, damos permissão para que nosso orgulho fale mais alto do que a razão. Corremos o risco de nos tornarmos insensíveis e opressores, desencadeando uma discussão acalorada ou calando o outro.
Todavia, como evitar que o desejo de auxiliar o outro no “equilíbrio dos pratos” se transforme em uma batalha pelo convencimento? É necessário vigiar o nosso próprio sentimento. Se nos sentimos incompreendidos e entramos na defensiva, podemos estar prestes a desrespeitar o outro.
Além disso, a resistência à informação, seja verbal ou através da expressão corporal, é outro sinal que nos dá a percepção da falta de compreensão do nosso interlocutor e é quando devemos mudar de atitude. Então, precisamos eliminar a possível postura de “orientador” e a substituir pela de amigo solidário, buscando entender os motivos pelos quais a nossa locução foi repelida. Dessa forma, teremos subsídios para refletir sobre a conveniência da insistência no tema por vias alternativas ou recuar, deixando a semente à própria sorte.
Kardec, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, sabiamente nos ensina que as gerações têm sua infância, sua juventude e sua maturidade. Cada coisa tem de vir na época própria; a semente lançada à terra, fora da estação, não germina. Mas, o que a prudência manda calar, momentaneamente, cedo ou tarde será descoberto, porque, chegados a certo grau de desenvolvimento, os homens procuram por si mesmos a luz viva; pesa-lhes a obscuridade.[2]
Importa lembrar que se faz caridade quando observamos a condição daquele que nos ouve. Não se trata de condescendência, mas de respeito ao tempo de cada um. Como Kardec bem nos orienta, oportunamente, a semente germinará.
Lembremo-nos de que estamos muito distantes da perfeição. Por mais boa vontade que tenhamos em auxiliar, a insistência pode nos dar a aparência de superioridade que é prejudicial a qualquer processo de transmissão do conhecimento.
Além disso, quando nos colocamos na posição de convencer alguém sobre nossa opinião, podemos perder valiosas oportunidades de aprendizado a partir daquele com quem falamos. Experiências de vida diferentes da que possuímos frequentemente proporcionam novas perspectivas e quebram paradigmas.
Precisamos estar conscientes de que não basta levar a luz, uma vez que a iluminação depende do interesse e da capacidade de aquisição de conhecimento daquele que está na sombra. O aprendizado pela força não se sedimenta, ao contrário, é levado pelo vento da incerteza.
Não é sem razão que Jesus falava por parábolas quando apenas poucas pessoas seriam capazes de compreender seus ensinamentos sem a utilização de alegorias.[3] Em verdade, o exemplo ainda é a melhor forma de aconselhar àqueles que não são capazes de compreender o verbo.
Sejamos luz, mas observemos com cautela o limite do outro. Antes de insistir em falar, devemos estar abertos a ouvir e estar sensíveis à capacidade e à necessidade do outro. Façamos ao próximo apenas o que desejamos para nós.
Lila
[1] Inspirado na Parábola do Semeador in KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Cap XVII item 5.
[2] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Cap XXIV item 4.
[3] KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Cap XXIV item 3 e MATEUS, 13:10 a 15