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Muitas dúvidas têm povoado a mente humana, principalmente quanto a questões existenciais. Dos pais e avós, ouviu-se desde sempre que o maior medo de suas vidas era morrer; que “a única certeza desta vida era a morte”. Ou que determinada pessoa, por suas más condutas, “arderia eternamente no inferno”.

Tais conceitos caberiam bem, em um contexto materialista, segundo o qual não existe mais nada após a morte, que a chegada desse desenlace físico é o fim, o nada, e que por isso mesmo a vida “precisa ser vivida”, custe o que custar.

Examinemos cada uma dessas questões à luz da Doutrina Espírita. O primeiro passo é compreender que nossa passagem pela Terra é um istmo de tempo, comparado à extensa caminhada, e que a “certeza da morte” não nos torna finitos. Que o nada (niilismo) pode até ser justificativa para o homem primitivo, cujas experiências não foram além de lutar pela sua sobrevivência, guiando-se pelo seu instinto animal de preservação. Para esse homem, o futuro seria apenas uma intuição.

Kardec, no livro O Céu e o Inferno, uma das obras da Codificação, distingue o futuro (ter uma vida pós-encarnatória) e o nada (niilismo), para onde a morte finda um processo material e sem perspectiva alguma de continuidade. O homem estaria dividido entre as necessidades materiais (o gozo fácil, o egoísmo característico do niilismo) e sua instintiva crença no futuro.

A evolução moral e espiritual aclara as informações acerca desse futuro: o que era instinto torna-se uma esperança; a Codificação traz à luz conhecimentos que a transformam em certeza. Portanto, cai por terra a ideia de uma vida finita nesta existência física. O que fazemos, sim, é nos despirmos de uma roupagem carnal, para permanecermos vivos em Espírito. A finitude terrena não faz qualquer sentido, à luz da Ciência.

Na esteira das dúvidas futuras, destaca-se o temor da morte. Kardec aborda o assunto no mesmo livro. O “medo de morrer” seria apenas reflexo do grau de materialismo do indivíduo. Portanto, o apego ao corpo (e a tudo o que a materialidade da Terra oferece) é proporcional ao desenvolvimento espiritual do Ser. Quanto mais intensa é sua dedicação aos prazeres carnais e aos bens materiais, maior será sua dificuldade em aceitar o desenlace físico previsto a todos.

Esse temor não cabe senão como efeito da sabedoria da Providência: ao aprofundar-se na Doutrina e praticar seus ensinamentos, o Espírito encarnado adquire uma compreensão mais ampla de sua longa jornada, substituindo uma visão pequena e restrita de vida vinculada à Terra por uma mais ampla, cósmica, dando novo sentido às diversas moradas da Casa do Pai. Eis que esse novo olhar faz com que ele perca o “medo de morrer” e perceba que a finitude da matéria, mesmo sendo uma certeza, não representa um fim em si mesma, e sim, um passo para seu futuro, dando-lhe o sentido de eternidade.

Se há dúvidas quanto à vida e à morte, não faltam conjecturas sobre a destinação do Espírito após a finitude da matéria. Para algumas religiões, o ponto de chegada seria classificatório (céu, purgatório e inferno) e imutável (o Espírito estaria sumariamente alocado ao ponto, sem qualquer possibilidade de mudar seu destino. Assim, aquele que fez o bem conquistaria o Reino de Deus; o que só propagou o mal seria visitante cativo do inferno; alguns ficariam “flutuantes”, em uma categoria intermediária do purgatório.

Sob essa ótica, que revela o conceito de um Deus castigador, conforme a era Mosaica, não há qualquer redenção! O Espírito torna-se devedor eterno de suas dívidas e não lhe são dadas condições para corrigir o mal, a despeito até de arrependimento.

O “Céu” pregado por outras religiões colocam a Terra no centro do mundo, e o homem como o Ser mais importante. Kardec lembra que devemos distinguir o que seria o ‘Céu’, para o Espiritismo: é o futuro, o que almejamos. Enquanto as demais doutrinas colocam a Terra no centro dessa referência, a Ciência provou sua nulidade, mostrando haver diversos outros sistemas solares, cujas possíveis formas de vida diferem enormemente do que conceituamos por conta da evolução moral e espiritual e por conta das características de cada planeta.

Esse conceito foi substituído pelo de um Deus de amor e caridade, trazido por Jesus. Seu Evangelho pregou o amor entre as criaturas, que não deveriam se julgar e, sim, deveriam ser o alicerce da redenção, umas das outras. Por seu lado, a Doutrina Espírita cuidou de esclarecer que as sucessivas encarnações seriam uma maneira de cada Espírito aprimorar-se moral e espiritualmente, tendo na Terra (planeta de expiações) terreno fértil para resgates.

Da mesma forma que o conceito de “felicidade” difere, entre encarnados, conforme o grau de evolução de cada um, também sua destinação ao desencarnar será única. O que amealhamos de conhecimento e o que praticamos com base nos ensinamentos do Evangelho de Jesus são o nosso verdadeiro passaporte para uma vida feliz, não importando quanto tempo (ou quantas encarnações) seja necessário para sua obtenção.

A Doutrina Espírita explicita que, por meio do amor e da caridade, podemos amar e ser amados, perdoar e ser perdoados. E se conseguimos, a exemplo de Paulo, reverter o mal que causamos, nossas penitências são suspensas. O que nos diferencia, aqui, é a nossa responsabilidade de aprimoramento pessoal (reforma íntima), conduzindo-nos ao avanço moral. A definição quanto ao nosso “destino” não está em atitudes à frente de um altar, e sim em nossas mãos, cotidianamente.

Nosso Pai, pura Misericórdia, substitui os castigos eternos pela consciência do Ser (Lei de Causa e Efeito). Dessa forma, permite que escolhamos (quando possível) a próxima etapa na Terra, inserindo no plano encarnatório as ferramentas necessárias para que os erros do passado possam ser corrigidos. Ele deseja que todos os desviados de Seu rebanho tenham a chance de voltar, de arrepender-se, de receber o perdão. O que nos aguarda ao término de cada encarnação, portanto, é fruto do que semeamos nela.

Conclui-se, portanto, que a crença na vida após a morte, o medo dessa finitude e a certeza de seu destino são elementos ligados à consciência. Cabe a cada um de nós estudar e praticar o Evangelho de Jesus para que os medos materiais sejam substituídos pela certeza de uma vida plena, amorosa e verdadeira. Como diria Emmanuel, em poema ditado a Francisco Cândido Xavier, “a morte é a própria vida, numa nova edição”.

Vanda Mendonça

 

Referências:

O Livro dos Espíritos (Instituto de Difusão Espírita, 2009)

O Céu e o Inferno (Instituto de Difusão Espírita, 2019)

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