“Ninguém acende uma candeia para pô-la debaixo do alqueire; põe-na, ao contrário, sobre o candeeiro, a fim de que ilumine a todos os que estão na casa.” (Mateus 5:15)
Educar é missão. Os pais e guardiões têm o dever de prover os recursos necessários ao desenvolvimento físico, mental e espiritual das crianças sob sua responsabilidade. O que seria educar? Qual é o papel do educador? Quais são os limites aceitáveis? Até quando insistir?
Nos dias de hoje, educar é tarefa das mais complexas. A abundância tecnológica e o fluxo constante de informações podem confundir até a mais lúcida e instruída mente. Uma infinidade de exigências sociais e expectativas próprias acabam por direcionar as ações na tentativa de prover o necessário para o desenvolvimento das crianças, tornando a rotina diária deveras materialista.
Nesse frenesi quotidiano, os valores morais acabam sendo repassados mecanicamente, conforme as oportunidades surgem, entre o almoço e a tarefa de casa. Inadvertidamente, essas orientações estão enraizadas no âmago do instrutor e são preconcebidas como corretas, sem qualquer reflexão.
Mas é necessário atenção: os tempos mudaram, crenças antigas foram desmistificadas pela Ciência e o Espiritismo trouxe uma forma diferente de perceber a criança. Sabemos que, sob a inocência anunciada pela imagem angelical, há um Espírito imortal com inúmeras reencarnações sobre os ombros.
A concepção de que uma criança é um Espírito experiente, cuja personalidade está provisoriamente adormecida, ressalta a importância dos pais em sua formação moral. Bem cedo, o educador deve fornecer-lhe influências positivas para que ela possa incorporar bons hábitos e valores mais elevados. Precisa produzir argumentos convincentes a ponto de fincarem raízes na alma de modo que, no futuro, tenha vontade de combater vícios e más-tendências que carrega de um passado próximo ou remoto.
Alguns conceitos, todavia, parecem ser tão óbvios para os atribulados adultos, que acabam por não imprimir a energia necessária a esse importante mister de educar. Frequentemente, esquecem-se da vantagem de serem percebidos por elas como facilitadores e aliados, quando é certo que poderiam aproveitar cada instante disponível para orientar, já que a infância é o momento da maleabilidade espiritual, ideal à lapidação.
A despeito de toda dedicação, inúmeras vezes os esforços parecem ser em vão. É quando surge o dever de lembrar que nenhuma criança deseja falhar. Se erra, é porque não sabe, não entende, não enxerga, não consegue. Todas as criaturas possuem defeitos e limitações, algumas aparentes, outras invisíveis, da vida atual ou das pregressas, que podem dificultar ou bloquear o aprendizado. Assim, a repetição do ensino é frequentemente necessária, e a paciência e humildade são valiosos recursos.
Nos momentos de desânimo, é importante manter em mente o objetivo: auxiliar a criatura a evoluir. Lembrar quem é o adulto da relação e o seu papel de candeia na missão. Entender que, se alguma estratégia deu errado, a “culpa” não é da criança, que ainda está em processo de aprendizagem. Então, é preciso insistir e considerar outras formas firmes, mas amorosas de atuação. Novamente, a humildade e a paciência são valiosas no recomeço do processo educativo.
O resultado da perseverança pode demorar anos, pois também depende da prontidão do Espírito em formação para absorver as orientações. Sendo assim, cada um deve abraçar a responsabilidade na sua parte do compromisso assumido com a Criação, a despeito de seus frutos.
A fim de alimentar a reflexão, selecionamos algumas recomendações para auxiliar na orientação dos pequeninos, todas inspiradas no Sermão da Montanha[1], contido em O Evangelho Segundo o Espiritismo:
Não proteja o seu filho do sofrimento. Antes, ensine-o a sofrer[2]. Quem sabe sofrer mantém a fé no porvir e o bom ânimo. Para tanto, não o defenda das críticas, mas ajude-o a refletir a respeito. Elas são excelentes oportunidades para a autoavaliação[3]. O autoconhecimento é fonte de sabedoria, onde aprendemos os nossos limites, desenvolvemos as nossas potencialidades e nos aperfeiçoamos em nossas fraquezas.
Ensine-o a refletir antes de agir. Reagir instintivamente aos problemas dificulta a obtenção de soluções pacíficas, agravando as aflições. Quando não for possível o consenso, precisamos aceitar e conviver com as diferenças[4]. Lembre-se de que, há menos de 200 anos, a escravidão era socialmente aceita, embora seja abominada hoje em dia. Quantos dos seus conceitos e valores terão o mesmo destino daqui a 50 anos?
Não julgue[5] o filho do próximo. Permita que o seu filho encontre dentro de si a tolerância, a solidariedade e o perdão, ainda que você não se sinta capaz de perdoar.
Da mesma forma, não julgue seu filho; antes, compreenda-o. O acolhimento fará com que ele seja mais receptivo às sugestões. Além disso, ele poderá replicar esse comportamento amoroso em outros relacionamentos, criando conexões mais saudáveis.
Estimule-o a meditar e a orar[6]. O silêncio interno traz serenidade. A oração o conectará com esferas superiores que o intuirão. Ensine-o sobre as influências que os pensamentos[7] exercem sobre nós e sobre o poder da vigília. Essa é a maior proteção que você pode dar ao seu filho.
Educar é tarefa sublime que ensina a crescer e aprende ensinando. Espelhe-se no Cristo. A melhor forma de educar é dar o exemplo.
Esse artigo é uma singela homenagem à professora Ignez De Biasi Pereira da Silva que, com suas aulas ao longo do primeiro ano do Curso de Estudos Espíritas no CECP, deu-me ferramentas para elevar o patamar de minha relação com meus filhos.
Gratidão eterna!
Lila
[1] Discurso no qual Jesus proclama as Bem-aventuranças, orientações de conduta e de cunho moral, encontradas nos Evangelhos de Mateus (5 -7) e Lucas (fragmentado).
[2] Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo V, Bem sofrer e mal sofrer.
[3] Orientações que Santo Agostinho pergunta 919-A de O Livro dos Espíritos sobre o autoexame de consciência.
[4] Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo X, Bem-aventurados os que são misericordiosos.
[5] Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo XII, Amai os vossos inimigos.
[6] Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo XXVII, Pedi e obtereis.
[7] Franco, Cleyton. O Pensamento in Informativo Caminho da Paz. Fevereiro de 2020.