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Com frequência, temos sido bombardeados pela mídia com casos que expõem quadros de degradação física, moral e espiritual. Mais que discutir as questões éticas envolvidas, a massa responde prontamente com atos e palavras que conduzem ao julgamento. Usam pela metade tanto as regras legais quanto as religiosas, tentando imprimir legitimidade à sua posição. Tornam-se, dessa forma, especialistas na condenação ao próximo. Vale questionar: que parâmetros teria essa sociedade para nortear as manifestações que acusam ou defendem as partes, fazendo das redes sociais seu palanque moral?

Para compreender as regras de “justiça”, sob a ótica humana, é preciso lembrar o que essa sociedade considera errado (definido pelas leis vigentes), tolerável (não é o ideal, mas faltam leis que explicitem isso) e certo (aceito dentro nas normas vigentes). Em cada país, conforme sua cultura, há variáveis: desde casamentos precoces e poligamias a torturas, regras baseadas na Lei de Talião e penas de morte sumárias para crimes hediondos.

Lembremo-nos de que as tragédias humanas são presenciadas desde os primórdios tempos, em todas as partes do planeta. Sua exposição pública também. No entanto, o grau elevado com que são expostas faz com que ânimos sejam insuflados em defesa dos que são as vítimas – mesmo que os algozes em questão sejam tão vitimados quanto os que subjugam.

Ao longo dos séculos, povos têm sido dizimados com crueldade para que grupos políticos conquistem territórios; líderes religiosos usam o nome de Deus para eliminar aqueles que discordam de seu pensamento; líderes políticos caçam os adversários com rigor e usam outros valores para seus simpatizantes. Como se vê, a justiça do homem transita conforme a cultura de seu povo, ou conforme seu aprimoramento espiritual.

Voltemo-nos ao fato de estarmos em um planeta de expiação, que caminha para uma transição em mundo de regeneração. Além de respeitar o regramento humano, nosso aprendizado exige que atentemos também para as normativas do Plano Espiritual.

Quando Jesus nos disse “Amai-vos uns aos outros”, eliminou a possibilidade de desejarmos o mal ao próximo; ao pedir que amássemos “nosso inimigo”, excluiu qualquer hipótese de o atacarmos; e quando disse para perdoarmos “70 x 7” (Mateus 18:21-22), deixou claro que o perdão é nossa maior meta de aprimoramento espiritual, contrária ao conceito da Lei de Talião[1] e a qualquer atitude de vingança; afinal, contra a rigorosa reciprocidade do crime e da pena, como previa Talião, “o amor cobre a multidão dos pecados”, disse Jesus a Pedro (Pedro, 4:8). Ou seja, o bem é capaz de anular o mal que provocamos, permitindo assim que reescrevamos nossa jornada ao praticá-lo.

E quando Jesus afirmou “não julgueis”, lembrou-nos que não temos estofo moral e espiritual para julgar o próximo, mesmo quando este avança contra as leis do homem. Lembrou-nos nossa condição de falíveis e, portanto, passíveis também de julgamento. No entanto, não cabe ao homem julgar outro homem sob o aspecto moral, considerando-se que esta seara de aprimoramento nos propicia situações nas quais seremos experimentados, conforme o que nos foi designado em projeto reencarnatório.

O que chamamos de juízo de valor não está ao alcance de nosso conhecimento, pois sob o ponto de vista da vida do Espírito – muito mais longeva que o período sobre a Terra – não há como definir bem e mal. Não julgar significa respeitar a Justiça Divina, as leis de Causa e Efeito e as Leis Morais. Significa lembrar que nossa função, diante do caos instaurado e da inversão das regras, é orar pelo planeta, por aqueles que se encontram em situação de abandono, vitimados por tragédias cotidianas. É enviar nosso pensamento e nossa energia ao que vive no cárcere, para que se arrependa dos atos e encontre o perdão.

Por outro lado, ao nos confrontarmos com situações que nos impelem a julgar, devemos nos lembrar de que nada mais são que instâncias colocadas diante de nós para avaliar se continuamos no caminho reto do Cristo ou se tomamos atalhos que nos permitem “atirar pedras”. Se não somos os “donos da verdade”, se não temos suporte moral e espiritual para julgar, também não estamos aqui para um debate sobre os casos degradantes em si, mas sobre o que nos cabe fazer: usar nossa palavra ou conduta para reprovar ou usar nossa energia para fazer a caridade?

Ao longo de todo o Evangelho de Jesus, temos encontrado apelos diversos para que nos restrinjamos àquilo que procede de nós, e com certeza não há nada que nos autorize julgar alguém. No Evangelho de Mateus, cujo versículo primeiro do seu capítulo sétimo dá título a esta leitura, o Mestre deu inúmeros exemplos de que não devemos dar ao outro senão aquilo que desejaríamos a nós mesmos. Isso pressupõe o direito do perdão, conforme nosso grau de evolução. E como estamos em um patamar em evolução, essa condição não nos torna capazes de emitir um julgamento justo e imparcial. Não sabemos, por exemplo, os fatos pregressos que desencadearam determinada situação; muito menos as razões que levaram seus contendores a esse envolvimento. Abstermo-nos de julgar é prudente, porque “com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós” (Mateus 7:2); mas acima de tudo, é um exercício de amor e de caridade ao próximo, seja ele a vítima, seja ele o algoz. Compreendendo que a Justiça maior caberá ao Pai, a recomendação de Jesus é de que usemos a prudência, pois que somos imperfeitos e incapazes de perceber, neste mundo, qualquer percepção da realidade sob a ótica da evolução espiritual.

 

Vanda Mendonça

 

Referências:

  1. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 119. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. cap. 10, item 16.
  2. Op. cit. cap. V, item 24.
  3. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Questão 764. 29 Edição, 1986, pelo Instituto de Difusão Espírita.
  4. O Consolador, ano IV, número 157, de 09/05/2010.
  5. Revista Espírita (Revue Spirite, Journal d’Études Psychologiques), publicada sob a direção de Allan Kardec. Paris, 1/01/1858, em versão traduzida pela FEB e, 2004.

 

[1] “O Consolador”, edição n 157 (9 de maio de 2010),

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