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Com o sono diário a que todos os seres humanos entregam-se, ocorre a libertação da alma que respeita não só a necessidade de refazimento do organismo físico, como também de renovação da vida mental do Ser.

Mas não é necessário que ocorra o sono profundo para que se verifique a libertação da alma. Basta a diminuição das funções orgânicas através do relaxamento, da meditação, da prece, atos que quando bem realizados prostram as forças vitais e entorpecem os sentidos mais grosseiros, propiciando certa liberdade à alma que passa a ingressar na dimensão espiritual (1).

Assim, seja no sono profundo, no cochilo de minutos ou na sensação de torpor com a manutenção de algum estado de vigília, nossas almas libertam-se das amarras densas da matéria, projetando-se às vivências da dimensão sutil.

Os sonhos representam o resultado dessas vivências da alma fora do corpo físico e, se deles comumente não nos lembramos ou mesmo nos recordamos de forma fragmentada, muitas vezes sem qualquer sentido lógico, é porque “… como é pesada e grosseira a matéria que o compõe, o corpo dificilmente conserva as impressões que o Espírito recebeu, porque a este não chegaram por intermédio dos órgãos corporais.” (2).

São linguagens distintas aquelas que transpiram da energética da alma e do corpo material, mesmo que ambos integrem a mesma personalidade. Aquela experimenta a ação sutil da dimensão espiritual, enquanto este vivencia os movimentos brutos característicos da materialidade. Difícil, portanto, a conexão em sintonia e, por conseguinte, a lembrança das experiências colhidas nos sonhos, ante a diferença dos estratos em que se situam.

Mas no movimento inexorável da evolução todos caminhamos para o domínio cada vez mais pleno da emancipação das nossas almas.

Os Espíritos de André Luiz (3 e 4), e Manoel Philomeno de Miranda (5), pontificam que os caminhos para recordações mais amplas e detalhadas dos nossos sonhos denominam-se iluminação ou adestramento da alma.

Essas concepções parecem-nos revestidas de uma lógica insuspeita, partindo-se da constatação de que a iluminação ou o adestramento do Ser, naturalmente sob a ótica moral, diminuem as diferenças irradiatórias entre corpo espiritual e corpo material, facilitando o fluxo de informações daquele para este e, por conseguinte, das respectivas lembranças oníricas (relativas aos sonhos).

Mas, ao menos por ora, ainda nos debatemos no amontoado de entulho mental, representativo das tendências que trazemos ao longo dos séculos.

São nossos hábitos comportamentais que identificamos na culpa, na agressividade, na vingança, na impaciência, na sensualidade, na preguiça, na apatia, no vício, no apego, na desonestidade, na inveja, na intolerância, na precipitação, na ansiedade, dentre outras tantas manifestações do nosso psiquismo, que nos situam nos cenários dos sonhos extravagantes, fantásticos ou assustadores que nada têm de real sob a ótica material, mas que representam, sim, a recordação de lugares e coisas com os quais a alma teve contato durante o repouso do corpo físico (6).

Mesmo os sonhos mais inverossímeis são realidades executadas pela imaginação das almas, semelhantes às criações fluídicas do pensamento, conforme esclarecido por Allan Kardec em A Gênese (7 e 8).

Por essas razões, paralelamente ao esforço sincero que empreendemos no sentido de nossa reforma íntima, é importante que criemos mecanismos mentais preparatórios aos períodos de descanso do corpo físico, visando colher, durante a libertação das nossas almas, experiências oníricas construtivas, mesmo que delas não nos lembremos.

Nas horas em que estivermos em vigília (acordados), utilizemos padrões de autossugestão que devem ser repetidos mentalmente com alguma frequência durante o dia como, por exemplo: “Durante o sono do corpo físico quero que minha alma se dirija ao Caminho da Paz para receber auxílio dos Espíritos ou para auxiliá-los, se reunir condições para tanto.”

O comando mental repetido várias vezes durante o dia, cria o cenário favorável para que o objetivo se realize sem que se dispense, e isso é importantíssimo, o preparo adequado para a libertação da alma, através da leitura de um texto edificante, seguida da prece-passaporte com a qual nos candidataremos às experiências mais qualificadas.

Mas é pertinente esclarecer que nem a repetição disciplinada e diária do comando mental indutivo, nem a leitura reiterada de textos instrutivos e tampouco as preces pronunciadas com o coração no período de vigília, revestem-se em garantia absoluta de que não teremos, vez por outra, lembranças fragmentárias e perturbadoras dos nossos sonhos.

Isto porque nem sempre aquilo que nos propomos em vigília, guarda ressonância com as tendências ainda imaturas de nossas almas que, libertas da prisão dos nossos corpos, algumas vezes dão vazão aos hábitos multimilenares e às companhias espirituais de magnetismo quase irresistível, com relação às quais assentimos deliberadamente porque ninguém é obrigado a nada ante a vontade soberana do Ser.

Não queremos dizer com isso que o método da disciplina indutiva/autossugestão é falacioso (enganoso). Em matéria de Espírito, tudo é construção diária, de esforço reiterado e nem sempre estamos prontos a fazer frente aos arrastamentos que nos habitam há séculos, uma vez libertos de nossos corpos físicos.

A persistência disciplinada, mesmo ante resultados que não nos agradem, é a chave do sucesso na luta que travamos em nossas trincheiras íntimas.

O método da autossugestão pode ser aplicado, também, para avistarmos parentes, afetos e amigos desencarnados durante o sono, valendo assinalar que, nestes casos, além da nossa vontade real – aquela manifestada pelo interesse das almas libertas dos corpos físicos (9), deveremos contar, igualmente, com a vontade e a disponibilidade dos desencarnados que queremos encontrar. A conjunção desses dois fatores ensejará o encontro.

Finalmente, é bastante comum ouvirmos relatos de pessoas que se sentem cansadas após uma noite de sono, o que parece revelar uma incongruência (impropriedade), considerando que o sono, em tese, propicia o repouso do corpo físico.

Entretanto, os Espíritos esclareceram a Allan Kardec que isso é possível, “…pois que a alma se acha presa ao corpo qual balão cativo ao poste. Assim como as sacudiduras do balão abalam o poste, a atividade do Espírito reage sobre o corpo e pode fatigá-lo.” (10)

Interpretando o texto codificado observamos o vocábulo “sacudiduras”, que pode ser substituído pela locução sinônima: “agitar em diversos sentidos”. Se o balão agita suavemente, obviamente não abala o poste, mas se os ventos são agressivos a agitação é forte, refletindo essa força sobre o esteio que dela se ressente.

Assim, a linguagem cuidadosamente figurada dos Espíritos adverte para os sonhos de vendavais a que podemos nos lançar, exatamente por conta do automatismo dos entulhos de nossa individualidade, que são os principais responsáveis pela sensação de cansaço com a qual ocasionalmente despertamos.

Por tudo isso, contenhamos os ímpetos, disciplinemos os hábitos, lustremos os sentimentos e vivenciemos o Evangelho de Jesus nos limites de nossas forças, para que os nossos sonhos, e a nossa própria existência, figurem telas pintadas em tons suaves, mas vivos, representando a ética e a estética de Deus em cada traço.

Bons sonhos a todos!

 

Cleyton Franco

 

(1)     O Livro dos Espíritos, questão 407.

(2)     O Livro dos Espíritos, questão 403.

(3)     No Mundo Maior, FCX/AL, Cap.2

(4)     Missionários da Luz, FCX/AL, Cap. 8

(5)     Nas Fronteiras da Loucura, DPF/MPM, Cap. 30

(6)     O Livro dos Espíritos, questão 402.

(7)     A Gênese, XIV, 14

(8)     A Gênese, XIV, 27 e 28

(9)     O Livro dos Espíritos, questão 419.

(10)   O Livro dos Espíritos, questão 412.

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