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Trinta e um anos após o desencarne de Allan Kardec, amigos e colaboradores do inesquecível codificador providenciaram a edição de Obras Póstumas (1890), uma coletânea de textos e mensagens inéditas ao lado de reflexões e princípios do Espiritismo que já haviam sido divulgados por ocasião das Revistas Espíritas de 1858 a 1869, assim como de A Gênese em 1868.

Ao lado das diretrizes de natureza doutrinária, Obras Póstumas comporta advertências dos Espíritos a Kardec sobre a sua saúde, revelações sobre o seu Espírito protetor, a sua missão e até a sua volta em uma nova encarnação, dentre tantos outros assuntos.

Mas, no terço final da obra, há duas mensagens que merecem destaque, dada sua natureza de antevisão do futuro sobre os denominados “sinais dos tempos”, que inegavelmente vivenciamos nos dias atuais.

A primeira delas, intitulada Precursores da Tempestade, datada de 30 de janeiro de 1866, é assinada pelo Espírito Inocente, arcebispo da Táurida, antigo nome como era conhecida a atual península da Crimeia, e cujos termos são os seguintes:

“Nacionalidades! Que a Rússia não encontre terrível escolho, um Cabo das Tormentas, nessa palavra. Bem-amado país, não esqueçam os teus homens de Estado que a grandeza de uma nação não consiste em ter fronteiras indefinidas, muitas províncias e poucas aldeias, algumas grandes cidades num oceano de ignorância, imensas planícies, desertas, estéreis, inclementes como a inveja, como tudo o que é falso e emite sons falsos. Pouco importa que o Sol não se esconda sobre as vossas conquistas, nem por isso haverá menos deserdados, menos ranger de dentes, todo um inferno ameaçador e de gargantas escancaradas como a imensidade. As nações, como os governos, têm o livre-arbítrio; como as simples individualidades, elas sabem dirigir-se pelo amor, pela união, pela concórdia. Entretanto, fornecerão à tempestade anunciada elementos elétricos apropriados a melhor as destruir e desagregar.

Inocente.

Em vida, Arcebispo da Táurida.”

Recordemos que em 2014 a Rússia invadiu e anexou ao seu território a península independente da Crimeia, que integrou o território da Ucrânia até 1992.

A justificativa para a invasão, dentre outras razões de natureza geopolítica, foram as raízes históricas da Crimeia com o antigo Império Russo dos czares, que dele fez parte por séculos.

Entretanto, em 2022, a Rússia promoveu nova anexação, desta vez das cidades ucranianas de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhya, abrindo oportunidade ao conflito armado que já dura quase ano e meio, iniciando uma campanha de expansão das suas fronteiras sob o fundamento de resguardar o seu território dos interesses do imperialismo ocidental.

Pois bem, na referida mensagem Precursores da Tempestade, observamos que o seu subscritor é originário da Rússia, com atuação na região onde o conflito iniciou-se, Táurida ou Crimeia, e com a qual guarda laços de afeto, a ponto de se referir à Pátria russa com a expressão: “Bem-amado país…”

E continua o comunicante expondo o equívoco das políticas de expansão das fronteiras do Estado, cujas consequências desaguam em um oceano de ignorância e dores (ranger de dentes), a serem experimentadas pelos filhos da Rússia, colhendo os frutos amargos do seu próprio plantio.

A mensagem é arrematada com um alerta inquietante de desagregação do Estado russo, como efeito da causa expansionista.

E antes de se cogitar que a mensagem tenha sido direcionada à extinta União Soviética de Stalin e do pós-guerra, não é demais repetir que o mensageiro identifica a região de sua atuação enquanto encarnado, grifando no mapa da atual Ucrânia o objeto da sua apreensão, em uma clara alusão sobre o fato a que se referiu e que se desenrola, exatamente, nos dias de hoje.

Os sinais da tempestade estão dados. Nem por isso ferirão, no dizer do Espírito Inocente, “… as almas temperadas, os Espíritos esclarecidos, tudo o que for justiça, lealdade, honra e solidariedade.”, exaltando os princípios pétreos da Lei de Justiça, Amor e Caridade (O Livro dos Espíritos, 3ª parte, cap. XI).

Dito isso, voltemos a nossa atenção para a segunda mensagem, intitulada Regeneração da Humanidade, datada de 25 de abril de 1866, tendo sido obtida por duas médiuns em transe profundo, num estado de projeção da alma denominado sonambulismo (O Livro dos Médiuns, itens 172 a 174), em que é possível às sensitivas, dentre outras atribuições, que se movimentem naquilo que conhecemos como linha do tempo – passado/futuro, naturalmente assessoradas pelos Espíritos que se utilizam dessas oportunidades para nos trazer alertas.

Passemos ao exame da mensagem:

“Não acrediteis, porém, no fim do mundo material. A Terra tem progredido, desde a sua transformação; tem ainda que progredir e não que ser destruída…

O que se prepara não é, pois, o fim do mundo material, mas o fim do mundo moral …, dos preconceitos, do orgulho, do egoísmo e do fanatismo …

… os suicídios se multiplicarão em proporções inauditas, até entre as crianças. A loucura jamais terá atingido tão grande quantidade de homens que, antes mesmo de morrerem, estarão riscados do número dos vivos. São esses os verdadeiros sinais dos tempos e tudo isso se cumprirá pelo encadeamento das circunstâncias, como já o dissemos, sem que haja a mais ligeira derrogação das Leis da Natureza.”

A primeira parte da mensagem tem por objetivo desmistificar as interpretações literalistas das escrituras, esclarecendo que vivemos um tempo de transformação moral, e não de destruição do planeta por um cataclismo ou uma guerra nuclear que extinguiria a vida na Terra, submetendo-nos ao julgamento binário e eterno em que nos caberia ocupar um assento no céu ou um lugar inferno.

Os tempos são de modificações dos costumes, do plantio da humildade em face do orgulho, do altruísmo derrogando o egoísmo e da tolerância combatendo o fanatismo, mesmo que ainda muitos achem que vivemos dias em que os primeiros continuam a triunfar sobre os segundos, o que é um grande engano porque a humildade, o altruísmo e a tolerância atraem muito menos interesses do que os seus antípodas infelizes que nos mantiveram, até então, em um mundo em que o mal predomina sobre o bem (Evangelho segundo o Espiritismo, cap. III, 13 a 18).

Nessa Terra futura e transformada, alguns indícios da sua implantação são a multiplicação dos suicídios, inclusive em crianças, e a “morte de homens vivos”, verdadeiros sinais dos tempos que, por analogia, podem ser comparados ao fato de que febre alta é um sinal de que o organismo se movimenta pela obtenção da cura.

E a febre transitória revela que a taxa global de suicídios entre crianças do sexo feminino, de 10 a 14 anos de idade, aumentou de 0,5% em 1999 para 2% em 2019, e entre crianças do sexo masculino, da mesma faixa etária, os suicídios aumentaram de 1,9% para 3,1% no mesmo período. (https://www.msdmanuals.com/pt-br/casa/problemas-de-saúde-infantil/distúrbios-da-saúde-mental-em-crianças-e-adolescentes/comportamento-suicida-em-crianças-e-adolescentes)

Artigo publicado pela Organização Mundial da Saúde, em setembro do ano passado, noticia que as taxas de suicídio nas Américas aumentaram 17%, sendo a quarta causa de morte mais recorrente entre os jovens de 15 a 29 anos. (https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/setembro/anualmente-mais-de-700-mil-pessoas-cometem-suicidio-segundo-oms)

Nesse quadro absolutamente surreal, há jogos divulgados nas mídias sociais que propõem desafios progressivos a crianças e adolescentes, alguns deles culminando em morte por suicídio.

Há, outrossim, uma febre de automutilações nessa mesma faixa etária, em que cortes nos pulsos e nos antebraços tornaram-se comportamentos comuns entre meninas e meninos, em uma espécie de teste prévio ao ato extremo que, se não se consuma na maioria dos casos, dá exatamente a mostra do período de distopia previsto na mensagem.

E a loucura, que podemos substituir pelas enfermidades da mente, do psiquismo, ou da alma, “…atingindo homens que mesmo antes de morrerem estarão riscados do mundo dos vivos.”, campeia além dos muros restritos dos manicômios, varrendo os lares, dos mais suntuosos aos mais simples.

São inúmeros os exemplos de irmãos e irmãs incapacitados pelas doenças degenerativas do sistema nervoso que vão perdendo, paulatinamente, o raciocínio interativo, a identidade e a própria natureza, submergindo em um labirinto em que simplesmente deixam de Ser, tornando-se espectros estranhos àqueles que mais amaram e que mais os amam. Que dor lancinante, que morte diária vivenciada por todos os partícipes enredados na degenerescência mental, processo expiatório que risca os enfermos do mundo dos vivos sem que tenham desencarnado.

Nos dias de hoje, não é necessário que nos sirvamos das estatísticas oficiais para constatar como a “falência” das mentes encontra-se proliferada entre nós. Difícil encontrar alguém que não viva/tenha vivido quadro semelhante no próprio lar ou não conheça um ente próximo que experimente essa dor.

Desta forma, passados cento e cinquenta e sete anos das previsões contidas em Obras Póstumas, apesar das suas cores carregadas e sombrias, não resta dúvida que nos encontramos em pleno alvorecer de uma nova Era, na qualidade de copartícipes desse grande projeto de transformação, a ser conduzido pelos campeões do Espírito, boa parte deles já encarnada entre nós. Serão eles os responsáveis pela implantação das novas diretrizes éticas que vigorarão nos próximos milênios da Terra regenerada, que não mais comportará as conquistas vazias, as aberrações da moda e a morte em vida, porque estaremos em outro grau de compreensão do processo de Deus.

Cleyton Franco

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