Skip to main content

A visão faz com que se veja o mundo em torno, e a vida que nele palpita na sua metamorfose constante e infinita. O que se vê hoje, sofreu mutações ao longo do ontem e será diferente amanhã. Através dos olhos o Ser se orienta e se guia, tanto no caminhar como no juízo que faz das coisas.

O olhar, quando se detém sobre determinado foco, tal como uma câmera fotográfica, registra o instante da ocorrência; esta, por sua vez, passará pelo senso crítico do observador, que numa triagem particular a qualificará segundo seu ponto de vista. Se os olhos forem “bons”, ainda que a questão em análise apresente desvios dos princípios básicos de harmonia que regem a vida, conseguirá interpretá-la com um toque de piedade e compaixão; mas, se forem “maus”, acentuará os agravos num tom por vezes irônico e descaridoso. Essa variante de interpretação está intimamente ligada com a performance espiritual intrínseca a cada criatura, isto é, sempre em relação direta com sua moral.

A correlação que há no mecanismo de “ver” e “interpretar” encontra suporte no “modus operandi” executado pelo perispírito, processo esse que ocorre de forma automática e instantânea.

Joanna de Ângelis na obra Opinião Espírita, cap. 4, informa pela psicografia de Divaldo Pereira Franco, que: “O perispírito se faz responsável pela transmissão ao Espírito, das sensações que o corpo experimenta, como ao corpo informa sobre as emoções procedentes das sedes do Espírito, em perfeito entrosamento de energias entre os centros vitais ou forças, que controlam a aparelhagem fisiológica/psicológica e as reações somáticas, que lhe exteriorizam os efeitos do intercâmbio”.

Ora, sendo assim, isso significa que o olhar registra as sensações que as imagens provocam ao corpo, e as conduz, pelo perispírito, ao campo mental do indivíduo (Espírito), onde se transformam em emoções, positivas ou negativas, segundo seu grau evolutivo. Isto explica a diferença entre “olhos bons e olhos maus”.

Um mesmo foco é passível de várias interpretações (sensações), dependendo sempre do Espírito que o analisa, sofrendo a influência do progresso e da evolução que ele vai realizando através dos tempos: um simples abraço afetivo pode ser visto com olhos maliciosos e transformar-se em cena libidinosa; ou então, com olhos ciumentos, que veem sempre no outro(a) um perigo, uma ameaça, criando embaraços que só existem em sua mente doentia… Todavia, pode provocar alegria e admiração aos olhos que aguardam o desenvolvimento da afetividade entre as criaturas, e que se regozijam com o abraço de ternura e saudade entre entes em que o tempo e a distância os mantiveram separados…

São muitos os olhos que veem o mal, e reduzidos os que enxergam mais além, nas entranhas da alma. Somente galgando a escada da evolução espiritual poderá a criatura apropriar-se dos “olhos bons”.

Cada degrau evolutivo opera mudanças comportamentais que transformam pouco a pouco o modo de se ver as pessoas e o próprio Universo em que se vive.

Relata Saint-Exupéry, em sua obra O Pequeno Príncipe: “O essencial é invisível aos olhos”. Sim, pois o essencial só pode ser visto pelos olhos da alma.

Que medidas temos para identificar a qualidade do nosso olhar?

Tomemos por parâmetro o do Cristo Jesus. Óbvio que, alcançar a condição de percepção do Mestre não é tarefa de uma encarnação, mas de sucessivas e reiteradas experiências na carne, no exercício de aprimoramento do Espírito.

O Mestre tinha “olhos de ver…”, poder esse decorrente de Sua significativa posição espiritual. Sendo Ele a maior expressão de pureza que já existiu sobre a Terra, conseguia perceber no âmago de cada criatura, a centelha divina.

Na obra intitulada “Há Dois Mil Anos…” psicografia de Francisco C. Xavier ditada pelo Espírito Emmanuel (4ª ed. especial – p. 80/81), há uma passagem que relata o momento em que o senador romano Publio Lentulus (nome de Emmanuel à época) procura pelo Mestre na Galileia em busca da cura para sua filha que se achava gravemente enferma.

Jesus lhe diz: “[…Senador, fora melhor que me procurasses publicamente e na hora mais clara do dia, para que pudesses adquirir, de uma só vez e para toda a vida, a lição sublime da fé e da humildade…]”

Sobre essa passagem, Haroldo Dutra em seu livro “E o Verbo se fez Parábola” – 1ª ed. p.48), comenta: “Nessa única frase está implícito o caminho evolutivo de Emmanuel. O Mestre sabia que humildade e fé representavam a dificuldade de aprendizado daquele Espírito. Aquele encontro fugaz representava a grande hora, o momento mais importante para o Espírito imortal do senador. Ele se achava diante da grande oportunidade de renovação. Seguir Jesus imediatamente ou dali a milênios era escolha sua…

A figura distinta daquele homem, aos olhos do povo era de um senador romano, mas aos olhos de Jesus, era Emmanuel…”

Da mesma forma, aos olhos do povo Simão Pedro não passava de um rude pescador, mas aos olhos do Cristo, era um “pescador de almas”…

Todos viam Saulo como o perseguidor intransigente dos cristãos; mas Cristo via Paulo, como apóstolo dos gentios…

Leitor amigo, o mal é uma contingência. Só o bem possui existência real e é imperecível. A centelha divina que palpita em toda a Criação é a prova inconteste desta assertiva.

Da obra “Nas Pegadas do Mestre” da autoria de Pedro de Camargo (Vinicius), 6ª ed., pág. 290, transcrevemos:

“Jazia um cão morto, já em estado de decomposição, estendido sobre o pedrado de uma rua. Sobre aquele corpo esvoaçava e zumbia um enxame de moscas. Todos que por ali passavam, levavam o lenço às narinas, deixando escapar, um tanto indignados, exclamações como estas: Que imundície! Que asquerosidade! Que podridão!

Eis que Jesus, transitando a seu turno por aquele local, volve seu doce olhar para as ruínas daquela forma animal que se decompunha, e diz: Pobre cão; que belos dentes tinha ele.

E foi assim que o Justo soube descobrir no meio da podridão alguma coisa cuja pureza e frescor havia escapado à vista dos demais…” (Leão Tolstoi)

É que os olhos dos justos são puros, e, por isso, só veem o bom e o belo, enquanto o dos ímpios, embaciados pela malícia, só distinguem o mal e o horrendo.

Necessitamos aprender a olhar. Há que se ter o Espírito mais desprendido das coisas materiais; mais educado nos parâmetros espirituais, que tudo observa através de uma ótica mais abrangente, analisando os seres e as coisas na sua essência, na sua completude, de forma integral.

Enxerguemos o bem onde momentaneamente viceja o mal…

 

Yvone

Leave a Reply