Corria o final dos anos 60 do século passado quando religiosos americanos contestaram, na Suprema Corte o ensino da Teoria da Evolução, cujo principal e mais conhecido expoente foi o naturalista Charles Darwin (1809/1882).
Esses religiosos restabeleceram, em várias escolas, o ensino do criacionismo bíblico (A Gênesis mosaica), em substituição aos fundamentos evolucionistas, cuja divulgação tornou-se proibida.
Muitos pais não concordaram com a modificação e acionaram a justiça americana, visando restabelecer o ensino tradicional da evolução das espécies.
A demanda chegou na Suprema Corte que decidiu que a proibição do ensino da Teoria da Evolução era inconstitucional, porque violava a separação entre Estado e Religião, e o ensino evolucionista voltou à grade das aulas.
Algum tempo depois, entre os anos 70 e 80, os mesmos religiosos, que passaram a se autodenominar criacionistas científicos, acionaram os seus representantes nas casas legislativas de alguns estados americanos, aprovando leis que obrigavam as escolas a ensinar, tanto o evolucionismo, quanto o criacionismo, destinando o mesmo tempo de ensino a ambos.
Novamente a mais alta corte manifestou-se pela inconstitucionalidade das leis estaduais, esclarecendo que o ensino do criacionismo científico era religião, porque atribuía a um ser metafísico a origem de todas as coisas do mundo, inclusive o homem.
Sem se darem por vencidos, os criacionistas científicos, adensados por indivíduos com militância na Ciência, criaram, nos anos 90 do século passado, o movimento D.I. (design inteligente), objetivando continuar a sua cruzada contra o materialismo evolucionista.
Resumida e basicamente, aduzem que os seres vivos são complexos demais para serem explicados por processos naturais, em que a vida surgiu e se desenvolveu por modificações aleatórias – a seleção natural – e que em muitas espécies não se verificam os elos de transição que comprovam, a evolução/mutação de uma espécie para outra.
Defendem a existência de um Designer Inteligente, um projetista criador do mundo e dos seres, que se recusam, por motivos óbvios, a chamar de Deus, alegando que a T.D.I.- Teoria do Design Inteligente é Ciência.
A Ciência, por sua vez, demonstra que a complexidade dos seres vivos se explica pela seleção natural, suficientemente provada pela observação; que o fato de alguns elos entre espécies não serem demonstráveis, não desmerece a gama de achados que provam a mutação/evolução da maciça maioria dos seres vivos, e que atribuir a criação a um ente metafísico não pode ser considerado Ciência.
Feitas estas superficiais considerações acerca do antagonismo entre Evolucionistas e Inteligentistas, como são conhecidos os partidários do design inteligente, cabe examinar qual a posição do Espiritismo sobre esse embate que remanesce até os dias de hoje. (1)
De início convém esclarecer, com base nas manifestações de Emmanuel (2) e André Luiz (3), que a criação planetária deu-se pela ação ou permissão dos Mandatários de Deus, Seres ou Ministros angélicos, dentre eles Jesus, que presidiram a consolidação da Terra após o desprendimento da nebulosa solar, lançando, posteriormente, os fundamentos da vida neste planeta.
A criação da Terra e das condições propiciadoras ao desenvolvimento das criaturas, foram, pois, ações praticadas pelas Inteligências Divinas, observando o mandato que lhes foi conferido pelo Senhor da Vida (A Lei), sendo certo que, segundo a preleção do Espírito de André Luiz, esse princípio vale não só para o nosso planeta, mas para toda a criação da imensidão cósmica, erigida e renovada por essas Inteligências em regime de cocriação com Deus, pois “…o Espírito Criado pode formar ou cocriar, mas só Deus é o Criador de toda a Eternidade.” (4)
É claro que o Espiritismo não defende a criação instantânea, pronta e acabada, pelo simples “estalar dos dedos” de Deus, ou de seus Mandatários, considerando as miríades de provas irrefutáveis colhidas nos sítios arqueológicos e nas revelações da Biologia, da Antropologia, da Geologia etc., que demonstram a evolução das espécies em uma incontestável dinâmica de seleção, processada ao longo de bilhões de anos.
Na visão Espírita a teoria da evolução das espécies é o instrumento legítimo que preside as infinitas transformações que se encadeiam na Natureza, “…desde o átomo primitivo até o arcanjo que também começou por ser átomo.” (5).
Nem por isso entendemos possível excluir-se Deus, e os Seus Arquitetos, da manifestação de mais pura beleza em que se constitui a marcha inesgotável da evolução, considerando que “todo feito inteligente tem uma causa inteligente. (6 e 7)
Em decorrência do princípio acima citado, é de rigor lógico aceitar a participação de Inteligências Diretoras nos atos relativos à criação, experimentação, mutação e saltos evolutivos das espécies, em vez de se levar à conta da aleatoriedade, como quer a Ciência, o admirável progresso dos seres e das coisas.
Mas nossas convicções sobre Deus, por mais que gritem lógica e razoabilidade, são artigos de fé.
Deus não é passível da nossa observação, experimentação ou análise (alguns dos critérios adotados pelo método científico), porque não pode ser percebido pelos sentidos físicos que ainda norteiam a Humanidade terrena.
Só poderemos compreendê-lO quando dermos um salto rumo à perfeição (8), quando nos convertermos no super-homem de Ubaldi (9), que se relaciona com o Cosmo não mais com o cérebro imperfeito e tacanho, mas por síntese da consciência expandida.
Enquanto não formos capazes de tal proeza, importa assumirmos as nossas crenças sem querer emprestar-lhes trajes que ainda não lhes cabem. Deus não se prova porque está muito além do método científico. Esse é o recado aos nossos companheiros Inteligentistas que querem submete-lO à camisa de força da Ciência humana.
Quanto a nós, Espíritas, somos criacionistas evolucionistas, e não vemos nisso nenhuma incongruência. Cremos em Deus e seus Arquitetos presidindo o progresso de todos os seres, progresso esse que ocorre, tanto na esfera material, quanto no plano extrafísico, o que explica o fato de que variados elos da evolução fujam da observação da Ciência, como nos informam, André Luiz e Léon Denis. (10 e 11)
Como cremos no corpo espiritual, sabemos que as etapas evolutivas envolvendo os reinos processam-se, inicialmente, a partir desse elemento etéreo que é a matriz geradora da matéria impressionável.
É nesse elemento etéreo que as espécies vão registrando as suas experiências, inicialmente em grupo, e posteriormente individualizadas, até que esgotem as possibilidades de aprendizagem psíquica, se assim pudermos nos expressar, credenciando-se para a etapa ou segmento imediatamente subsequente, sob o amparo das forças extrafísicas auxiliadoras dos saltos evolutivos, tanto mais presentes e atuantes, quanto mais fragmentárias forem as consciências candidatas à promoção.
Eis uma pálida sinopse da ótica Espírita sobre a evolução das espécies, merecendo ser transcrita a título de encerramento deste artigo a alentadora manifestação de Emmanuel, segundo a qual: “Todas as teorias evolucionistas no orbe terrestre caminham para a aproximação com as verdades do Espiritismo, no abraço final com a verdade suprema.” (13)
Que assim seja!
Cleyton Franco
(1) Folha de São Paulo, edição de 08/02/2020, seção “Tendências e Debates.”
(2) A Caminho da Luz, Francisco Cândido Xavier, Espírito Emmanuel, Cap. I, – A gênese planetária.
(3) Evolução em dois Mundos, Francisco Cândido Xavier, Espírito André Luiz, Cap. III – Primórdios da vida.
(4) Ibidem – Cap.I – Cocriação em Plano Maior.
(5) O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 540
(6) O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 4.
(7) A Gênese, Allan Kardec, Cap. II, 3.
(8) O Livro dos Espíritos, Allan Kardec, questão 11
(9) A Grande Síntese, Pietro Ubaldi, Cap. LXXXIII – O Super-Homem
(10) Evolução em dois Mundos, Francisco Cândido Xavier, Espírito Emmanuel, Cap. III – Elos desconhecidos da evolução.
(11) O Problema do Ser, do Destino e da Dor, Léon Denis, Cap. IX – Evolução e finalidade da alma.
(12) O Consolador, Francisco Cândido Xavier, Espírito Emmanuel, questão 41.