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Um número significativo de pessoas teimam em confundir as faculdades mediúnicas com a Doutrina dos Espíritos, simplesmente porque foi através desta que melhor se explicou e divulgou o intercâmbio entre as almas provisoriamente encarceradas no carro físico e as habitantes do plano de origem, isto é, o dos desencarnados. Por isso que, sistematicamente, quando algum médium comete qualquer desvio de conduta, os desinformados o associam a alguém filiado ao Espiritismo. Nosso propósito é tentar desmistificar essa distorção.

Partindo-se do princípio básico de que todos os Espíritos encarnados promanam do mundo espiritual e que num dado momento de sua existência a ele retornarão para prosseguimento da vida imortal, tem-se por certo que entre uns e outros se estabelece uma natural sintonia, mais ou menos intensa, conforme as circunstâncias. Por isso pode-se afirmar que esse intercâmbio sempre existiu, desde os mais remotos tempos, em todos os planos da vida e nos mundos habitados por seres inteligentes, abstraindo-se dele qualquer concepção de sobrenaturalidade. Disso resulta a conclusão categórica de Allan Kardec: “Todo aquele que sente, num grau qualquer, a influência dos Espíritos é, por esse fato, médium. Essa faculdade é inerente ao homem; não constitui, portanto, um privilégio exclusivo. Por isso mesmo, raras são as pessoas que dela não possuam alguns rudimentos. Pode, pois, dizer-se que todos são, mais ou menos, médiuns. Todavia, usualmente, assim só se qualificam aqueles em que a faculdade mediúnica se monstra bem caracterizada e se traduz por efeitos patentes, de certa intensidade, o que então depende de uma organização mais ou menos sensitiva”([i]).

A literatura mediúnica revela que essa faculdade eclodiu no meio de religiões e doutrinas das mais diversas origens, tendo como protagonistas monsenhores, sacerdotes, mentores Yogas, pastores protestantes, umbandistas, sem qualquer espécie de privilégio. Ramatis ([ii]) recorda que os profetas eram médiuns poderosos. Jonas, Isaías, Jeremias, Ezequiel, Daniel, Naum, Samuel, Job, Habacuc e outros contribuíram para as narrativas bíblicas com seus poderes mediúnicos. Moisés sabia extrair ectoplasma à luz do dia; praticava levitações, era médium de transporte e de efeitos físicos, tendo além disso o dom da cura. Pietro Ubaldi, declaradamente não espírita, compôs “A Grande Síntese” – cuja primeira edição data de 1937 – e outras tantas obras a partir de inspiração mediúnica. Alguns exemplos mais: Francisco de Assis revelava as chagas de Jesus; Antonio de Pádua transportava-se em Espírito de Portugal à Espanha, para salvar o pai inocente; Vicente de Paula extinguia úlceras à simples imposição das mãos. Lutero, João Huss, Sócrates, Pitágoras, Apolônio de Tyana revelaram-se médiuns, embora nenhum deles conhecesse o Espiritismo. “Buda foi a antena viva ligada ao Alto, vertendo para a Ásia a mais elevada mensagem espiritual”.

Allan Kardec estudou todos os fenômenos dessa natureza, findando por catalogar alguns mais comuns dentre os de efeitos físicos e psíquicos, conforme obra editada em 15 de janeiro de 1861 ([iii]). Também não lhe passou desapercebida a análise das qualidade morais dos médiuns, exemplificando com detalhes os imperfeitos e os bons ([iv]).

Trataremos dos médiuns curadores, por sua especificidade e para atender às dúvidas em torno do rumor que recentemente envolveu um deles. Esse tipo de mediunidade consiste no dom que o indivíduo possui para curar pelo simples toque, pelo olhar, ou mesmo por um gesto, sem o concurso de qualquer medicação, dado o grau de magnetismo e o controle que dele fazem. O Espírito do magnetizador é assistido por um Espírito desencarnado, passando ambos a operar a transmutação dos fluidos (matéria cósmica) do organismo doente, obtendo o equilíbrio e a cura. Mesmo os magnetizadores que não acreditam nos Espíritos muitas vezes são por estes auxiliados, porque, em suma, a obra é voltada para o bem, atendendo às necessidades humanas, sempre ao abrigo da misericórdia divina.

Importa abrir um parênteses para uma explicação rápida sobre como ocorrem as curas através da influência magnética ([v]): o fluido universal – elemento primitivo do corpo carnal e do perispírito é manipulável pelo Espírito encarnado ou desencarnado, que infiltra parte dessa substância sadia num corpo doente, operando-se a cura mediante a substituição de uma molécula doentia por uma sadia, utilizando-se da energia de sua vontade. Conforme seja o potencial e a qualidade dessas energias, a cura pode ser instantânea. Essa ação magnética dá-se de três maneiras: a) pelo fluido do próprio magnetizador, sem interferência espiritual – magnetismo puramente humano; b) pelo fluido dos Espíritos agindo diretamente, sem intermediação de agente encarnado, denominado magnetismo espiritual; c) pelo magnetismo misto, quando os Espíritos atuam sobre o magnetizador, combinando os fluidos espirituais com os materiais, fornecendo a este último as qualidades que lhe faltam. Esta a hipótese que se enquadra no parágrafo anterior. Mas fica claro que nem todo magnetizador – curador – é médium, embora possa deixar a impressão de que opera num intercâmbio espiritual inocorrente.

A mediunidade de qualquer gênero pode ser suspensa por vários motivos, alguns deles referidos pelos Espíritos que responderam a perguntas elaboradas pelo Codificador ([vi]), podendo-se assim resumir: o Espírito comunicante ou fornecedor de fluidos magnéticos não quer ou não pode mais servir ao médium em virtude do uso que este faz de sua faculdade, especialmente quando dela se sirva para coisas frívolas ou com propósitos ambiciosos.

Recordamos uma experiência infeliz do passado não muito remoto ([vii]). Grigore Rasputin (21-01-1869 a 30-12-1916) foi um místico espiritualista influente na Corte Russa, no final do período czarista. Nascido na Sibéria foi encaminhado para um mosteiro com o objetivo de se tornar monge, mas não completou os estudos. Tornou-se curandeiro real da família do Czar Nicolau II e de sua esposa. Curou o filho Alexei que sofria de hemofilia. Chegou a ser considerado sábio e santo, apesar de analfabeto. Profetizou sua própria morte – findou assassinado – e a queda do czarismo pela revolução Bolchevique. Foi acusado de “dormir” com as mulheres que o consultavam para livrá-las de seus pecados e ajudá-las a encontrar a graça divina. Seu comportamento era devasso, o que lhe rendeu a alcunha de “o santo que pecava”. Maiores detalhes sobre sua biografia serão encontrados em “Legião – um olhar sobre o reino das sombras”, obra ditada pelo Espírito Ângelo Inácio sob a psicografia de Robson Pinheiro, Editora Casa dos Espíritos. Sem dúvida, Rasputin era médium sem ser espírita e tinha plena consciência de seus dons. Se fez deles bom uso, também por eles comprometeu-se moralmente.

Apesar dessas pessoas citadas serem médiuns não espíritas, ou mesmo não serem intermediários entre os dois planos da vida, isso não significa que no meio daqueles que o sejam não possa existir algum irmão desalinhado moralmente, porque o Ser Humano, em todos os níveis sociais e religiosos está sujeito às quedas decorrentes de suas fraquezas. E todos eles, a seu tempo e a seu modo, haverão de se ajustar com a Justiça Divina, porquanto a Lei de Progresso atua inexoravelmente em benefício da individualidade. Assim é que, independentemente de ser Espírita, ao médium é concedida a faculdade porque dela precisa para se melhorar. Se não aproveita a concessão, comportando-se segundo os padrões morais exemplificados pela Doutrina do Cristo, que valoriza o semelhante como criatura irmã a ser amada e respeitada, sofrerá as consequências, conforme advertiu o Espírito Erasto: “Aprenderão à sua custa o que resulta de aplicarem, no interesse de suas paixões terrenas, um dom que Deus lhes outorgara unicamente para o adiantamento moral deles. Se os não puderdes reconduzir ao bom caminho, lamentai-os, porquanto, posso dizê-lo, Deus os reprova” ([viii]).

O importante, diante de fatos concretos ocorrentes na atualidade, é mantermos a serenidade, evitando julgamentos precipitados, continuando a irradiar energias salutares em benefício do progresso planetário.

 

Marcus Vinicius

 

[i] LIVRO DOS MÉDIUNS (O) – Allan Kardec – Tradução de Guillon Ribeiro – FEB – 59ª edição, pág. 203.

[ii] MEDIUNISMO – Ramatis, pelo médium Hercílio Maes – Libraria Freitas Bastos, Ed. 1961 – págs. 19 e 20.

[iii] LIVRO DOS MÉDIUNS (O), págs. 203 a 233.

[iv] Idem, págs. 241 a 245

[v] GÊNESE (A) –Os milagres e as predições segundo o espiritismo – Allan Kardec – Apresentação e notas de J. Herculano Pires – FEB – 1ª edição 2008 – Capítulo CURAS – págs. 305 a 307.

[vi] LIVRO DOS MÉDIUNS (O) Idem, item 220, págs. 259 a 263.

[vii] wwwebiografia.com – acesso em 09/01/19.

[viii] LIVRO DOS MÉDIUNS (O), pag. 243.

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