O livre-arbítrio é definido pela faculdade intelectual que o Ser humano tem de fazer escolhas segundo a sua vontade. Não obstante a definição, desde que inaugurou a filosofia, o homem se questiona quanto a essa ser, de fato, uma faculdade sua, pois entende que vive preso a um corpo o qual não raro o desagrada, e que está sujeito às convenções sociais, às obrigações laborais e à própria família, inúmeras vezes motivo de desavença e desgosto.
Sob esse ponto de vista, é compreensível que o livre-arbítrio seja visto como uma obra de ficção criada para iludir, já que, com frequência, quando exercita o seu poder de escolha, o homem nem sempre obtém o resultado pretendido, mas, ao contrário, acumula reveses. Aqueles que se agarram a tais reflexões não conseguem enxergar a vida terrena sob uma perspectiva evolutiva.
Quando Jesus foi enviado à Terra, dois mil anos atrás, declarou:
“Ninguém deita remendo de pano novo em veste velha, porque semelhante remendo rompe a veste, e faz-se maior a rotura. Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás, rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam”.[1]
Ao utilizar os vocábulos “velho”, “novo” e “vinho” na parábola, Cristo os associou às existências materiais anteriores e futuras, ensinando que a reencarnação é necessária para que seja possível uma renovação; e concluiu que pequenos ajustes aqui e acolá não alteram a natureza do Espírito, antes, o atrasam.
A Providência Divina concedeu à Humanidade a chance de, periodicamente, renovar-se por meio da reencarnação, na medida em que ela favorece o desenvolvimento moral e intelectual e proporciona saltos evolutivos rumo à perfeição que a Criação almeja para as suas criaturas. A cada existência material, o Espírito recebe uma nova oportunidade de aprender e de reparar os erros cometidos nas vidas passadas.
Para funcionar como instrumento de renovação, o projeto da reencarnação exige certo determinismo em virtude de haver toda uma programação prévia das provas e expiações pelas quais o Espírito passará ao renascer no mundo material. Mas esse determinismo se limita apenas ao planejamento, pois é o indivíduo encarnado quem irá decidir se aproveitará as provas para o seu aprendizado ou se as desperdiçará com lamúrias; é ele quem escolherá entre cumprir a sua função frente à evolução do globo, padecer no ócio ou, ainda, contribuir para o mal.
O Espírito, em sua existência material, tem o livre-arbítrio para agir conforme a sua consciência, acelerando ou retardando o seu desenvolvimento. Quanto mais evoluído for, maior a responsabilidade na disposição do poder de escolha para com a sua oportunidade reencarnatória, tendo em vista a própria participação no planejamento das provas pelas quais deve passar e de estar comprometido com elas.
“Tudo me é permitido, mas nem tudo convém”[2].
Enganam-se aqueles que entendem o livre-arbítrio como a possibilidade de exercitar o poder da escolha sem que as consequências[3] negativas sobrevenham aos atos maléficos ou à própria inércia. Aqueles que creem no determinismo por se julgarem sofredores não compreendem que estão submetidos ao compromisso assumido na erraticidade e ao resultado advindo de seus atos na vida corrente. As Leis Naturais são inexoráveis. É necessário perceber as dificuldades impostas pela escola da vida como uma oportunidade de evolução moral para que se compreenda que não há determinismo total e nem exercício do livre-arbítrio sem consequências.
O determinismo reside, portanto, e unicamente, nas consequências dos atos praticados em uma reencarnação anterior, refletidos na existência seguinte sob a forma do planejamento das provas e expiações as quais passará o Espírito.
A despeito da compreensão dos desafios da realização da reforma íntima sob os aspectos material e espiritual, é fato que a evolução rumo à perfeição exige que o Homem se dispa dos envoltórios inferiores e seja capaz de reconhecer o mal que o acomete, de perdoar e pedir perdão.
Não basta, porém, fazer escolhas tendo em vista somente a própria evolução moral e intelectual. A Humanidade tem um compromisso com a Criação no sentido da evolução do Globo. Faz-se necessário olhar para fora de si, “ver com olhos de ver” e “ouvir com ouvidos de ouvir”[4]. A caridade e o amor não podem se limitar apenas àqueles que nos cercam diariamente; mas devem ser estendidos a todas as criaturas na medida da capacidade e possibilidade de cada um.
O Evangelho é um conselheiro sábio e valioso, o estudo é o meio, a fé é o caminho e o amor, o fim.
Lila
[1] (Mateus, 9:16-17)
[2] Paulo, em Carta aos Coríntios (6:12)
[3] Raciocinado em cima da Lei da causa e efeito
[4] Inspirado na leitura dos textos do livro “Palavras da Vida Eterna”, capítulo 71: “Olhos”, capítulo 72: “Ouvidos” e em “O Livro dos Espíritos”, capítulo VI, itens 4 e 5.
Grata por me fazer entender sobre determinismo e livre arbítrio